quinta-feira, 23 de junho de 2011

Jayme Cortez, a aventura de um desenhista português em Terras de Santa Cruz.

Nas oficinas de História em Quadrinhos que realizo no Garatuja, uma das primeiras coisas que faço é descondicionar o participante. A grande maioria dos garotos tem o Mangá como única referência. Nada contra, mas conhecer o que se faz, e principalmente o que se fez no Brasil, e no mundo, é fundamental. Aí entra o trabalho de Jayme Cortez. Em qualquer citação sobre a Historia da Banda Desenhada no Brasil, seu nome é um capítulo a parte. Na primeira exposição Internacional de Quadrinhos, que foi realizada  aqui no Brasil em 1951, lá estava ele ao lado de Álvaro de Moya, Syllas Roberg, Reinaldo de Oliveira e Miguel Penteado. Mesmo antes de Roy Lichtenstein pensar em colocar a imagem dos quadrinhos nos Museus, essa turma já fez isso. De Portugal, país onde nasceu em 1926, Jayme Cortez trouxe a experiência para realizar aqui a difícil arte das histórias em quadrinhos, e nisso é considerado “mestre” por importantes artistas que ajudou a formar. É consenso, entre todos que o conheceram, sua generosidade para com outros artistas, principalmente os iniciantes. Sua intenção era que deixassem de copiar os grandes clássicos e desenvolvessem seus próprios estilos. Que o digam Maurício de Sousa, Flávio Colin, Julio Shimamoto e tantos outros. E não foi só nos quadrinhos que Jayme Cortez empregou seu talento. Como artista gráfico realizou inúmeros cartazes cinematográficos. Muitos dos filmes de Mazzaropi tiveram cartazes feitos por ele. Como reconhecimento na área foi instituído, pelo Banco Itaú em 1977, o Prêmio Jayme Cortez para a melhor ilustração de cartaz de cinema. Foi ainda pintor, gravurista, publicitário, professor e autor de quatro livros sobre a técnica de desenho e ilustração. Se não bastasse tudo isso ainda participou, como ator, de propagandas e filmes de Zé do Caixão. Em 1986 Jayme Cortez foi homenageado em Lucca, Itália, com o Prêmio Caran D'Ache, no XX Festival Internacional de HQ e Ilustração, pelos seus 50 anos de atividades. Sua biografia é extensa e melhor que reproduzir suas realizações é indicar o blog que o Fabio Moraes e o Jayme Cortez Filho estão produzindo sobre sua vida e obra  http://jaymecortez.blogspot.com/ . Nota-se nele o carinho e a dedicação com que é realizado, e que só poderia ter sido feito por um fã e admirador de seu trabalho. De lá extraí o link que segue para o vídeo “As Aventuras e Desventuras de um Ilustrador Português em Terras de Santa Cruz”, gentilmente cedido pelo Fabio Moraes. Nele Jayme Cortez não perde a oportunidade de defender o quadrinho nacional. Eterno batalhador da classe, “foi um dos idealizadores do projeto de reserva de mercado para a produção nacional de HQ, reservando dois terços do espaço para artistas locais, que chegou a ser entregue às autoridades, mas nunca implantado”.  http://jaymecortezvideos.blogspot.com/2011/04/gravacao-do-documentario.html .

Revistas de Jayme Cortez no Garatuja
A revista comemorativa A Arte de Jayme Cortez está disponível para consulta, entre outras preciosidades, no Garatuja. Nesta revista tem uma história completa de Dick Peter, o detetive criado por Jerônymo Monteiro, roteirizado por Syllas Roberg e desenhado por ele, em que o herói desvenda o mistério do roubo do Plano Sono X, antes de cair nas mãos de exércitos inimigos. O detetive Dick Peter foi o personagem que inaugurou a literatura policial no Brasil, e Jeronymo Monteiro foi também um dos precursores da Ficção Científica Brasileira, ao lado de meu amigo e conterrâneo André Carneiro. A revista traz ainda um texto curioso sobre como fazer uma história em Quadrinhos publicada originalmente em 1952. Zodiako é outro gibi disponibilizado aos alunos do Garatuja. Para muitos é considerado seu maior trabalho e mereceu elogios até de Moebius. Publicado primeiro na Itália, Zodiako é um herói que concentra as qualidades das doze figuras dos zodíacos, além dos poderes de Hydra e Cetus, e tem como missão enfrentar a tirania representada por um velho Apolo, que começou correto, mas rendeu-se aos encantos do poder, não permitindo a sucessão do novo Apolo (Qualquer semelhança é mera coincidência). Nesse gibi o que chama a atenção é o uso primoroso da técnica de bico de pena e uma paginação incrível. Outra revista do acervo do Garatuja é Saga de Terror, obra póstuma de Jayme Cortez que traz interessante versão da música Coração Materno, de Vicente Celestino. A história leva o nome de Magoou-se, pobre filho meu? ...onde tragédia não falta. Conta o que aconteceu com o camponês que matou a mãe e arrancou seu coração para provar seu amor à debochada amada. Outra versão de música para quadrinhos é Asa Branca, mesmo nome da obra de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira, onde Jayme Cortez, através do desenho, nos revela toda tragédia e terror presente na letra. Latir para a Lua é outra versão desenhada de Bark at the Moon, do roqueiro Ozzy Osbourne. Outras duas histórias ao estilo de O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde merecem destaque: Retrato de Jeny e a clássica Retrato do Mal, onde uma pintura é o elo de ligação com as forças do sobrenatural. O acervo do Garatuja conta ainda com outros gibis, com capas de Jayme Cortez realizadas na década de 50, como por exemplo Aventuras Heróicas, da Editôra La Selva.
Márcio Zago